Ano de 1946. Escola Rural em Valinhos, para onde eu ia de charrete, por uma estrada de terra do final da Avenida da Saudade, de Campinas, até a entrada da zona rural de Valinhos. Aí havia um prédio com um salão onde estava instalada uma escola e a professora havia tirado licença. A condição era que a professora que iria assumir aquele trabalho, além de ter sido aprovada em um concurso, teria que pagar o aluguel do prédio.
Tudo bem, negócio fechado. Meu entusiasmo foi muito grande sempre! Comecei meu trabalho, naquele tempo em que na mesma sala havia alunos do 1°, 2°, 3° e 4° anos primários. Chão de tijolos e pelas janelas uma paisagem belíssima que na hora do recreio eu fui pintando a óleo numa tela que enfeita nossa casa até hoje. Que saudade! Mas, como tudo o que é bom dura pouco, depois de algum tempo recebi a intimação: desocupar o prédio. Pobre de mim e de minha criançada.
Insisti com a proprietária, mas ela foi irredutível. Depois fiquei sabendo o motivo. Ela tinha um filho moço que estava se insinuando, se debruçando na janela da sala de aula para conversar comigo. Como meu objetivo não era esse, ele e a mãe resolveram me expulsar da área!
Tudo era possível naquele tempo! Voltei de mala e cuia, muito triste com o ocorrido, sem saber se a proprietária havia encontrado mais tarde alguma donzela para seu filho e qual foi o fim de minha escolinha.
A luta de uma professora recém-formada foi sempre enorme! Tive uma amiga que ingressou no magistério estadual e a vaga que conseguiu foi num local muito distante. Seu problema maior era a falta de água no sítio onde ela foi dar aula. A sitiante lhe dava uma garrafa de água por dia, para beber, e “tomar banho”! Imaginem o sufoco que passava essa coitada!
Outra recém-formada foi para uma cidade bem distante. Ela chegou e logo foi admirada por sua beleza na pequena localidade. O gerente da cidade era o mais cobiçado galã da região. Encontraram-se, casaram-se e foram morar numa fazenda que compraram por ali. Oito filhos, um por ano, e a região ficando mais povoada.
Certa vez, nos visitando, nos contou que só havia carne na fazenda onde ela morava quando matavam algum boi. Mas, lá havia muitas vacas e as crianças se alimentavam com muito queijo. Consumiam um queijo inteiro em cada refeição. Que beleza! Os casos que aconteciam até a sofrida professora ir se transferindo para lugares melhores dariam muitas páginas de um livro! Mas, a garra era grande e o entusiasmo fazia com que a resignação fosse maior!
Os pais das crianças de sitiantes agradeciam o trabalho de tanta luta das professoras com presentes como cereais, frutas, bolos, ovos, verduras etc. Enfim, entre todas essas guerreiras, quero homenagear minha mãe, que criando quatro filhos ao mesmo tempo em que lecionava, lutando, viajando em trens de carga vazios de transportes de gado para chegar mais cedo em casa, foi para nós, seus filhos, um exemplo de abnegação e amor pela causa do ensino!
Foto: Divulgação/Internet.
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